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Brasil amplia o alcance da indústria de defesa e bate recorde em autorizações de exportação

O aumento no alcance internacional e nos valores autorizados evidencia o fortalecimento do setor no cenário global

Publicado em 19/11/2025

 

O setor de defesa brasileiro vive uma fase de expansão consistente. Em novembro de 2024, o Ministério da Defesa (MD) registrou um recorde de R$ 9,53 bilhões — cerca de US$ 1,65 bilhão — em autorizações para exportação de produtos e serviços de defesa. O crescimento se intensificou em 2025: entre janeiro e julho, o volume autorizado já alcançava US$ 2,021 bilhões, superando em 13% todo o resultado do ano anterior.

Além do aumento no valor autorizado, ampliou-se de forma significativa o alcance da indústria brasileira no mercado internacional. O MD contabilizou 100 países como destino das exportações em 2024, número que avançou para aproximadamente 140 países em 2025, revelando maior diversificação geográfica e reduzindo a dependência de poucos compradores. Essa ampliação da presença brasileira contribui para aumentar a previsibilidade de negócios e fortalecer a Base Industrial de Defesa (BID) no exterior.

Mas o que significam essas autorizações?

Do ponto de vista técnico, trata-se de anuências concedidas pelo governo para que empresas brasileiras negociem e exportem produtos e serviços de defesa. Embora não representem embarques imediatos, essas autorizações funcionam como indicador antecedente de vendas, e nos últimos anos, a conversão dessas autorizações em exportações tem sido elevada, refletindo o vigor real do setor.

A legislação brasileira define com precisão os produtos envolvidos. Os Produtos de Defesa (Prode) abrangem bens, serviços, obras e informações destinados às atividades finalísticas de defesa, excetuados os itens de uso meramente administrativos. Os Produtos Estratégicos de Defesa (PED) são uma categoria específica de Prode cuja tecnologia, complexidade ou relevância os tornam essenciais para a segurança nacional. Já as Empresas de Defesa (ED) e Empresas Estratégicas de Defesa (EED) recebem credenciamento específico do MD, conforme a Portaria GM-MD nº 3.693/2024, a Lei nº 12.598/2012 e o Decreto nº 7.970/2013, que tratam de compras governamentais e incentivos ao setor.

No centro desse arranjo está a Base Industrial de Defesa (BID), conjunto de organizações públicas e privadas responsável por pesquisa, desenvolvimento, fabricação, distribuição e manutenção de produtos estratégicos de defesa. Documentos estratégicos do governo apontam a BID como componente relevante para soberania tecnológica, autonomia industrial e capacidade de resposta militar.

O avanço recente resulta da combinação de dois vetores; no ambiente interno, o aumento da demanda por equipamentos e soluções tecnológicas voltadas à segurança pública impulsionou empresas nacionais a desenvolver e produzir Prode — desde forças policiais estaduais até operações de fronteira. No ambiente externo, o cenário de tensões geopolíticas, conflitos em diferentes regiões e acelerado rearmamento global ampliaram a procura por sistemas, tecnologias e serviços de defesa. Em um sistema internacional marcado pela ausência de uma autoridade central, como destaca Kenneth Waltz em Teoria da Política Internacional (1979), os Estados tendem a reforçar sua capacidade militar como mecanismo de equilíbrio frente a potenciais ameaças. 

Seguindo essa lógica, Peter Gourevitch (1978) argumenta que em tempos de maior ameaça percebida pelos formuladores de políticas públicas, faz com que a política doméstica se adeque às necessidades sistêmicas, ou seja, o nível de ameaça percebido pelos estados gera maiores incentivos para a formação das condições para o aumento de relevância da indústria de defesa, com o surgimento de mais empresas, um sistemas de inovação mais dinâmico, e política públicas e investimento que deem conta de preparar o país para os riscos existentes.

Assim, o crescimento das exportações brasileiras de defesa reflete tanto demandas domésticas quanto mudanças no cenário global. O fortalecimento da BID indica um ambiente mais favorável à presença do Brasil como fornecedor de tecnologias de defesa no mercado internacional. À medida que esse movimento avança, observa-se uma transição do esforço comercial isolado para a formação de um ambiente integrado, no qual Estado, indústria e instituições de pesquisa passam a atuar de maneira mais coordenada, buscando previsibilidade, escala e inserção qualificada.

Esse movimento recente vai além do aumento das exportações e sinaliza demanda internacional consistente por soluções de defesa brasileiras. No plano doméstico, o ecossistema ainda requer aprimoramentos — de coordenação institucional, previsibilidade regulatória e instrumentos de apoio — embora já conte com casos de sucesso que indicam caminhos escaláveis, das redes de inovação a formatos de negociação com participação governamental. Ao mesmo tempo, a aproximação entre Estado, setor privado e centros de pesquisa tende a fortalecer a capacidade de inovação e a reduzir gargalos históricos de inserção externa. 

O resultado é um setor que começa a operar de maneira mais integrada, com maior alinhamento entre objetivos empresariais e interesses estratégicos do país. Nesse cenário, a BID se projeta como alavanca para autonomia tecnológica, inserção internacional qualificada e geração de valor para a economia, condicionada à continuidade de ajustes institucionais e financeiros.

 

Texto por: 

Isaque Machado — Economista especializado em Indústria de Defesa

Bruno Haeming — Economista e Internacionalista

 

 

 

Referências

WALTZ,  Kenneth. Theory  of  International  Politics .  Reading,  MA.  Addison-Wesley  Publishing  Company, 1979.

GOUREVITCH,  Peter.The  Second  Image  Reversed:  The  International  Sources  of  Domestic  Politics International Organization, v. 32, n. 4, p. 881–911, 1978

 

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