Os benefícios associados que a digitalização e a IA podem proporcionar para a mitigação dos impactos ambientais negativos das nossas atividades, por meio de diversas soluções de inteligência e otimização na utilização de recursos, são inegáveis. Entretanto, o ciclo de vida dos recursos computacionais que dão vida às ferramentas de IA, por sua vez, também possuem impactos ambientais significativos, principalmente relacionados ao consumo de energia elétrica, consumo de água e descarte de resíduos.
Um estudo realizado por pesquisadores holandeses e publicado na revista Joule, aponta que uma pesquisa simples endereçada ao ChatGPT, consome 3 Wh (watts-hora), o que pode parecer pouco, mas que se multiplica rapidamente quando é sabido que são feitas mais de 2 bilhões de consultas por dia neste chatbot. Este consumo de energia elétrica está associado à necessidade de processadores poderosos de dados nos data centers que hospedam as tecnologias de IA. Estima-se que de 5 a 9% da demanda de energia global se destine a instalações de TI, e o consumo desses data centers poderá dobrar em 2026 se comparado a 2022, quando foi de 460 TWh. No mesmo ano, para fins de comparação, o Brasil consumiu 508 TWh (Vasconcelos, 2025).
Além do uso de energia elétrica, estão associados também à IA impactos ambientais ligados à geração de resíduos e ao consumo intensivo de água. Segundo ITU e UNITAR (2024), em 2022 o mundo gerou cerca de 62 milhões de toneladas de lixo eletrônico, um volume que inclui equipamentos utilizados em data centers — estruturas essenciais à operação da IA — e apenas 22% desse total foi reciclado adequadamente.
Esses centros, além de demandarem altos volumes de energia, utilizam sistemas de resfriamento líquido que consomem bilhões de litros de água por ano; estima-se, por exemplo, que o data center da Google em The Dalles, Oregon, utilizou 1,25 bilhão de litros de água somente em 2021. Esses dados reforçam a urgência de se adotar práticas sustentáveis na cadeia de infraestrutura digital, visando reduzir os efeitos ambientais negativos do avanço tecnológico. (Vasconcelos,2025)
O uso intensivo de energia elétrica por si só, não é necessariamente um problema, mas se torna um, quando a fonte desta energia não é renovável, pois neste caso estarão associadas às emissões de GEE de sua produção, aumentando significativamente a pegada de carbono da IA. (PNUMA, 2024).
Logo, em países onde a matriz de geração elétrica ainda é a base de combustíveis fósseis, como carvão, por exemplo, se faz necessário um investimento adicional em geração renovável, para que o balanço entre a solução proporcionada pela IA e sua pegada seja negativo. O Brasil possui aproximadamente 90% de geração renovável em sua matriz elétrica, o que vem atraindo investimentos das big techs como Amazon, Microsoft e Apple para a implantação de gigantescos data centers em seu território.
O mesmo conceito se aplica ao uso de água. Locais onde a escassez hídrica já é um problema, principalmente social, a implementação de sistemas de recirculação de água ou estudos de eficiência energética térmica (que mitigam o aquecimento e consequentemente a necessidade de refrigeração) devem ser integradas na concepção e implementação de data centers.
Em relação aos resíduos gerados ao longo do ciclo de vida de componentes de um data center, estes precisam necessariamente serem destinados de maneira adequada ao reúso ou ressignificação por meio da reciclagem, de maneira otimizada e eficiente.
A análise dos impactos ambientais associados à Inteligência Artificial evidencia que, mesmo em setores vistos como aliados da sustentabilidade, existem pontos críticos de consumo de recursos e emissões de GEE que não podem ser negligenciados. A IA, portanto, é apenas um exemplo dentro de um conjunto mais amplo de atividades que contribuem para a pegada de carbono de um território.
Se quisermos avançar de forma consistente rumo à descarbonização, é fundamental termos clareza sobre onde estão localizadas nossas maiores fontes de emissões, sejam elas vinculadas à infraestrutura digital, à indústria, ao transporte, à agropecuária ou a outros setores estratégicos. Nesse sentido, torna-se imprescindível a construção de um Painel de Descarbonização para Santa Catarina, capaz de integrar dados, apontar prioridades e orientar a tomada de decisão pública e privada.
Somente com uma visão sistêmica e transparente de nossas emissões será possível direcionar investimentos, alinhar esforços e transformar a descarbonização não apenas em um desafio a ser superado, mas em uma verdadeira alavanca de inovação, competitividade e desenvolvimento sustentável.
Texto por: Charles Leber - Consultor Sênior em Gestão de Gases do Efeito Estufa da FIESC